Dia Internacional do Leite: entrevista sobre produção, mercado e futuro

Data é reconhecida desde 2001 pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO)

01/06/2020 às 14:05 atualizado por Thalya Godoy - SBA | Siga-nos no Google News
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Em primeiro de junho, é celebrado o dia internacional do leite. A data foi instituída pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO/ONU), em 2001, com o objetivo de conscientizar a população sobre a importância dos lácteos para a manutenção de uma alimentação equilibrada.

Em alusão a data, o Canal do Boi conversou com colaboradores do MilkPoint, que realiza anualmente, há 19 anos, o ranking TOP 100 dos maiores produtores de leite do Brasil. Confira a entrevista com o sócio-diretor do MilkPoint Mercado, Valter Galan e com a médica veterinária e editora de conteúdo do MilkPoint, Maysa Serpa.


C.B.: Fazendo uma retrospectiva dos últimos cinco anos, como foi o desempenho do mercado de leite? E quais são as expectativas para este ano?
Valter:
Bom, nos últimos cinco anos, o mercado sofreu bastante em função do próprio desempenho da economia do país. O consumo de lácteos está muito associado a economia. Então, se a economia vai bem, ele cresce. Se a economia vai mal, ele vai mal também. Como a nossa economia foi mal de, praticamente, final de 2014 para frente, o consumo de lácteos sentiu bastante em todas as categorias. Existe uma perspectiva desse novo governo de começar a reagir, mas isso não se confirmou, pelo menos no ano passado. Esse ano, com a pandemia, também está complicado. Um ponto positivo, acho que conseguimos, finalmente, caminhar com as instruções normativas de qualidade, a 76 e 77 [2018]. Isso ainda está um pouco em discussão, aparentemente, no setor, mas acho bem importante para competitividade futura. A gente tem que falar de parâmetros homogêneos e de qualidade em toda cadeia, não dá para ter atores com base de padrão de qualidade muito diferente, como em alguns casos ainda tem.

C.B.: Quais foram as maiores conquistas do mercado de leite brasileiro nos últimos anos?
Valter: 
Essa questão das instruções de qualidade acho bem importante, ainda que estejam em implementação, é muito relevante. Recentemente, [tivemos] a abertura de mercados para exportação. A gente ainda não é competitivo estruturalmente para exportar, mas a abertura de mercados é importante para quando tiver excedentes exportáveis já ter um mercado aberto. Tivemos um aumento considerável de consumo nos anos 2000 até 2013/2014, isso foi um ponto bem positivo, mas que foi prejudicado pelo desemprego da economia do país a partir de 2015. A gente tem um potencial gigantesco de crescer, então isso é muito relevante.

C.B.: A falta de chuvas no Rio Grande do Sul deve afetar (ou já afetou) o mercado de leite nacional? Se sim, de que forma?
Valter:
 Sim, a estiagem no Sul atrapalha o mercado, porque nesse momento se esperaria um aumento dos volumes de leite vindos do Sul, em função do início da safra deles, principalmente, do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e sul do Paraná, o que, claramente, não está acontecendo pelo que houve de problemas climáticos. Isso aumenta a pressão no mercado. Tem pouco leite esse ano no mercado, ainda que a demanda também não esteja muito firme em função de toda questão da pandemia. Então sim, a questão do Sul atrapalha, como também atrapalham os preços de milho e de farelo de soja muito mais altos do que no ano passado. Isso tem desestimulado bastante o produtor de leite. Por isso, também, que a produção nesse ano vem tão desacelerada.

C.B.: Agora durante a quarentena, vocês observaram que os hábitos de consumo de produtos lácteos mudou? E na outra ponta, para o produtor rural, como foi sentido o impacto da pandemia do novo Coronavírus?
Valter:
O produto que dá para estocar, tipo leite em pó, leite UHT, teve um boom lá no começo da pandemia em março/ abril. Os preços subiram bastante, porque o pessoal se abasteceu com medo do que acontecesse, se poderia circular ou não. Houve queda drástica nas vendas de food service, como pizzaria, lanchonetes, etc., porque esses canais acabaram fechando, o consumo praticamente zerou, só ficou o delivery. Para os laticínios, principalmente, o pessoal do queijo que vendia para esses canais, tiveram que se virar por outros porque pararam de comprar, pelo menos até agora. Manteiga, requeijão, produtos para fazer refeições no lar também aumentaram bastante o consumo. Iogurtes, as embalagens familiares também melhoram um pouco, mas a categoria como um todo está perdendo. Para os produtores, não houve grande mudança, pelo menos, até agora. As empresas estão coletando leite, processando e vendendo os derivados lácteos. Não teve ainda graças a Deus nenhum fechamento de fábrica por incidência de Covid nos funcionários. Então, para o produtor, quer dizer, a situação é difícil, em função dos preços de milho e soja, mas isso não tem a ver com Covid-19, tem a ver com mercado, mas para o produtor, aparentemente, não mudou grande coisa porque o fluxo, pelo menos até agora, continua sendo normal de logística, compras e tudo mais.

C.B.: A MilkPoint realiza o TOP 100 dos maiores produtores de leite do Brasil. Como foram os resultados deste ano? Houve muitas mudanças na comparação com anos anteriores?
Maysa:
Desde a primeira pesquisa Top 100, tem sido observado um constante crescimento em volume e produtividade das propriedades envolvidas, principalmente, depois de 2011. A produção formal do Brasil também vem crescendo nestes últimos anos, contudo, o ritmo dos maiores produtores tem se mostrado bem mais acelerado. Em 2019, o volume médio diário fechou em 20.905 litros, um crescimento de 8,67% em relação a 2018 e de mais de 200% em relação ao primeiro levantamento realizado, em 2001. A região Sudeste segue como a maior produtora, mas estamos vendo um grande salto das regiões Sul e Centro-Oeste. Estamos observando também uma tendência de formação de clusters de produção, principalmente, no Paraná.

C.B.: Qual a importância de realizar este ranking, há quase 20 anos?
Maysa:
Eu resumiria a importância desse levantamento em dois pontos: informação e reconhecimento. A informação é a base para o desenvolvimento de qualquer atividade e o Top 100 é uma forma de levantar e transmitir dados sobre o setor. É claro que os 100 maiores não representam a realidade do Brasil, eles são a “ponta do iceberg” de toda a cadeia láctea. Contudo, nos ajudam a entender o rumo que a pecuária de leite vem tomando no país, principalmente, quando comparamos resultados entre anos. Os dados do Top 100 nos mostram ainda que é possível ser produtivo de formas diferentes, a pasto ou no confinamento, com diferentes raças, com diferentes sistemas de produção e em diferentes regiões. As mudanças e inovações muitas vezes se iniciam ali, servindo de modelo para os demais produtores. Sendo assim, o levantamento funciona como um “termômetro” de tendências. Além disso, é uma forma de reconhecer e agradecer os esforços de um setor tão importante para a economia e sociedade e também tão resiliente.

C.B.: Para os próximos anos, quais são as expectativas para o mercado de leite?
Valter:
A expectativa de que com o início de recuperação da economia, não sei se ainda nesse ano, talvez no ano que vem, a gente comece a recuperar o consumo de lácteos, que as instruções normativas sejam finalmente aplicadas de fato em campo, que isso ajuda a aumentar a nossa competitividade de produção, e eu acredito que no futuro o Brasil ainda tem condições de se tornar um competidor efetivo no mercado internacional. A gente tem muito potencial de crescimento, então no futuro será importante no mercado de lácteos, acho que pode ser um cenário de expectativas para o longo prazo, mas pode ser.


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