Pequenos produtores rurais modificam modelo de negócio durante a pandemia

Iniciativas públicas e privadas auxiliam agricultores familiares a escoar produção e acessar novos mercados

28/08/2021 às 09:32 atualizado por Thalya Godoy - SBA | Siga-nos no Google News
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As mãos calejadas, o chapéu na cabeça, a testa escura e vincada indicam que aquele trabalhador esteve por muito tempo lavrando debaixo do sol. Os braços ano após ano do pequeno produtor se familiarizaram aos movimentos de preparação da terra, do semeio e, posteriormente, da colheita da produção. Também não se esquecem da lida com os animais, da alimentação e nutrição repetida dia após dia. A obra no campo que, lá na frente, chega ao prato de um brasileiro.

Esse trabalhador da agricultura familiar compõe o principal grupo responsável pela produção de alimentos do Brasil. O Censo Agropecuário de 2017 indica que 77% dos estabelecimentos agrícolas do país foram classificados como pertencentes à agricultura familiar. No mesmo ano, 10 milhões de brasileiros estavam empregados na atividade.

A agricultura familiar teve que enfrentar muitos desafios durante a pandemia de Covid-19 para escoar sua produção, como a suspensão de funcionamento de feiras livres e cortes no orçamento do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que preveem compras de produtos dos pequenos trabalhadores rurais.

“As compras institucionais são fundamentais. É uma forma de garantir a compra da produção da agricultura familiar, como também o abastecimento na mesa das populações mais carentes. Com as crianças e jovens em casa sem ter a alimentação da escola, aumentam significativamente as despesas”, afirma a secretária de política agrícola da Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag), Vânia Marques Pinto.

Outro obstáculo que envolve os pequenos produtores durante a pandemia está a dificuldade de acesso à tecnologia que permita a comercialização diretamente com o consumidor, elenca a secretária.

No interior mineiro, o município de Rio Preto teve em março de 2020 sua feira livre suspensa devido à pandemia de Covid-19. Diante do cenário de restrições, a extensionista da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), Viviane Clementino, sabia que precisava encontrar uma solução para escoar a produção dos agricultores familiares. “Os produtores não tinham onde comercializar e precisavam vender porque o produto agropecuário é perecível, além de ser a fonte de renda também para a manutenção familiar”, ela relembra. 

Viviane criou, então, a Feira ON, que funciona como uma “extensão digital” da feira presencial. Foram criados perfis no WhatsApp e Instagram, e uma plataforma de vendas, como canais de contato e vitrine dos alimentos da Feira ON. A extensionista organizou também a lista de produtos e os preços de cada vendedor, com o apoio da prefeitura e voluntários das áreas de gestão, tecnologia e marketing

“Nós começamos a vender, só que estava desorganizado. Tínhamos que dar um jeito para que os produtores pudessem receber a solicitação da entrega e vir na cidade fazer o delivery. O que aconteceu no início? Não tem como o produtor vir todo dia. Na zona rural não tem internet, o que acaba sendo um empecilho porque não chega em todas as propriedades. Ele tinha que ir até certo local para ter internet e ver quais eram os pedidos e o dia de entregar”, relembra Viviane.

Produtor da Feira ON entrega mercadoria em domicílio. Foto por Divulgação

Depois o cronograma da Feira ON foi reformulado para resolver o problema com as entregas: de segunda a quinta-feira eram coletados os pedidos por uma voluntária. No sábado os produtores realizavam as entregas e no domingo eles enviavam o que teriam para comercializar na semana seguinte, para abrir o site de vendas na segunda-feira. 

Para participar da Feira ON, os agricultores familiares receberam treinamento de gerenciamento de mídias sociais, instruções de como participar de reuniões pelo WhatsApp e Google Meet, a como ajustar luz e ângulo ao fazer fotos e vídeos para valorizar seus produtos, aprenderam sobre o uso de ferramentas digitais gratuitas e a organizar a entrega respeitando os protocolos sanitários para prevenção da Covid-19, desde a embalagem até a entrega para o consumidor.

Vinte e seis feirantes adotaram a Feira ON para a venda de queijos, biscoitos, bolos, pães, doces, ovos, hortaliças, artesanato e frutas.

 

 

“A agricultura familiar é fundamental para manter o mercado interno abastecido e a alimentação na mesa da população brasileira, garantindo a segurança alimentar e nutricional que tem como base a produção orgânica e agroecológica, além de movimentar a economia local, principalmente, nos pequenos municípios”, afirma a secretária da Contag, Vânia Marques.

Com a experiência no uso das tecnologias durante o primeiro ano da Feira ON, os produtores ganharam autonomia e atualmente alguns são responsáveis pelos pedidos. “No início a gente fazia as vendas e agora eles mesmo fazem a comercialização usando o Instagram e Facebook da feira ou pela plataforma digital”, explica a extensionista Viviane.

 

“No começo ficamos meio receosos para mexer com mídias sociais, mas depois que começamos vimos que não era aquele ‘bicho de sete cabeças’”, relembra o produtor Silvio Oliveira, que comercializa doce de leite. No início da pandemia, ele estima que seu prejuízo chegou a 70%.

“Antes da pandemia a gente já tinha Facebook, Instagram e WhatsApp, mas com a Feira ON aprendemos a mexer e começamos a vender bastante. Toda semana tinha entrega, só que com o avanço da pandemia a gente deu uma maneirada, mas a feira online nos ajuda até hoje. Mesmo com a volta da feira presencial vamos continuar com a feira online”, afirma o agricultor.

Além do canal de comercialização virtual para escoar a produção, a Feira ON também proporcionou a expansão geográfica para a captação de clientes e a promoção do turismo rural na região. Os turistas que visitam o município entram na rede social da feira, realizam a encomenda e o produtor entrega o pedido nas pousadas. O mesmo turista também pode marcar um horário pela internet, mediante a uma taxa, para tomar café no sítio do produtor.

"Hoje mesmo uma moça me ligou lá do Rio de Janeiro e fazemos de tudo para entregar o pedido. Minha renda aumentou um ‘bocadinho’, está bem melhor do que estava. Estamos arrumando a propriedade, ampliando os espaços para receber as pessoas que querem comprar, visitar e degustar o nosso produto, seguindo os protocolos de higiene”, conta Silvio. 

Outra mudança que aconteceu na organização dos produtores do município durante a pandemia foi a regularização da Associação dos Feirantes de Produtos Artesanais do Município de Rio Preto e Região, com a criação do CNPJ, um objetivo cultivado desde antes da pandemia. O registro cria uma identidade e permite a participação em políticas públicas, obtenção de crédito rural e de doações pelo grupo.

 

 

Mais uma organização que surgiu a partir da Feira ON foi a Associação de Produtores de Queijos Artesanais do Vale do Rio Preto. No grupo de conversas com os participantes da feira foram identificados os produtores de derivados lácteos, que formaram a entidade. “Além de melhorar a nossa renda e a de outras famílias, agora estamos organizados”, afirma a presidente da associação, Samara Gatto.

Ela e o marido, Leonardo, fabricam doce de leite, queijos finos artesanais e iogurte artesanal, e precisaram ampliar o número de clientes para além das encomendas do consumidor final com a chegada da pandemia.

O casal obteve o registro no município para vender a produção para lojas e outros estabelecimentos, o que possibilitou manter o faturamento e o distanciamento social. 

Na Feira ON, eles enxergaram a oportunidade de dar continuidade ao trabalho que faziam nas redes sociais para ampliar a divulgação. “Entregar diretamente ao consumidor o produto escolhido anteriormente diminui os riscos de contaminação. Na maioria das vezes, o consumidor recebe o produto e efetua o pagamento através de aplicativos, o que facilita”, conta Leonardo Gatto.

 

Feira Segura
Em Corumbá (MS), Claudinei Marcon, de 45 anos, fazia sua renda entre as vendas como ambulante e produtor rural. Vendia os alimentos para o Programa Fome Zero, feiras livres, mercados e restaurantes. Com a chegada da pandemia e das medidas de restrição, começou a se dedicar exclusivamente à agricultura familiar. 

Claudinei e a esposa, atualmente, escoam a produção para mercados e uma feira livre. As vendas para o Programa Fome Zero, iniciativa do Governo Federal dedicada a combater a desnutrição da população brasileira, acontecem a cada dois ou três meses, o que não as tornam uma fonte de renda recorrente, relata o produtor.

Feira Segura permitiu a comerciaização de produtos da agricultura familiar. Foto: Wenderson Araujo/Trilux / Sistema CNA Senar

As vendas na feira livre, organizada pela prefeitura, sindicato rural e o Senar do município, aconteceram durante a pandemia devido a adoção de medidas recomendadas pelo manual da Feira Segura, criada pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA), que, em 2020, foi implantada em dez estados, atendeu 56 mil consumidores, em 88 municípios entre Bahia, Tocantins, Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pará, Mato Grosso do Sul, Goiás, São Paulo e no Distrito Federal.

O projeto objetiva viabilizar meios seguros para o retorno das feiras ao ar livre ou por Drive Thru para escoamento de produtos agropecuários frescos, seguindo os protocolos de segurança recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

“A gente fez essas adequações e orientou o produtor com base em capacitações do Senar em como deveria organizar essas feiras para que pudessem voltar a acontecer com autorização das prefeituras e dos governos estaduais”, afirma o coordenador de inovação do Sistema CNA/Senar, Matheus Ferreira.

 

Feira Segura atendeu 56 mil consumidores em 2020. Foto por Fredox Carvalho/ Sistema CNA Senar

Claudinei hoje planta alface, couve, pimentão, tomatinho cereja, berinjela, jiló, salsa, coentro, cebolinha, almeirão, quiabo e limão. A comercialização na Feira Segura, ele conta, impulsionou seu faturamento, mas vê potencial na demanda dos clientes para ampliar o número de edições. “A feira é muito boa e está recuperando os prejuízos. Os clientes estão gostando e precisamos ter mais de uma feira no mês”, acredita o agricultor.

Os produtores são orientados sobre cuidados de higiene sobre o acondicionamento dos alimentos em embalagens já pré-definidas, feitas um dia antes da feira, para evitar o hábito do consumidor em fazer a escolha do produto com o toque. Outras instruções incluem o uso de álcool em gel, máscara, água e sabão para lavar as mãos, e formação de corredores largos entre as barracas. As informações estão reunidas em um manual da CNA, que está disponível para download pelos produtores, associações e prefeituras que podem usar e fazer adaptações.

 

Durante a pandemia, a entidade também criou o Mercado CNA, uma plataforma online gratuita em que os produtores podem comercializar seus alimentos, com a criação de uma “banca virtual” própria, diretamente com o consumidor. A ferramenta possibilita o escoamento da produção e ampliação geográfica do mercado de clientes. A plataforma também oferece o cadastro de transportadoras que podem fazer a entrega para os produtores que não têm meios próprios para fazer o envio.

Matheus conta que o Mercado CNA tem uma boa adesão e acredita que é reflexo do interesse dos trabalhadores rurais em atender às compras no ambiente virtual. São em torno de 2 mil produtores cadastrados, de todos os estados, que oferecem uma variedade de 160 produtos, como queijos, hortaliças e embutidos. 

HomeHorta
A pandemia também foi o momento de virada na vida de quem decidiu largar a cidade e rumar para o campo. Juliana Santos, de 32 anos, decidiu sair do emprego no setor automobilístico e empreender com a família como pequenos agricultores na propriedade herdada pelo avô. Fundaram a “Hortaliças e Doces Caseiros do Vozão”, no interior paulista. 

A ideia era regenerar a área degradada, que 40 anos antes foi uma olaria abandonada, e recuperar a biodiversidade do espaço, alinhada a agricultura sustentável, alimentação de qualidade, manejo correto e respeito à vida da fauna e flora da região. Ela encarou a mudança como a oportunidade de aliar a paixão pelo meio ambiente com o crescimento que o modelo de negócio da agricultura familiar pode gerar.

 

 

 

“Acredito que as pessoas estão cada vez mais conscientes e querem buscar hábitos mais sustentáveis tanto de vida, quanto de consumo. Acho que coisas desse tipo foram um 'boom' na cabeça de muitos durante a pandemia. E falando sobre uma visão de negócios, o setor de alimentação passa a ser primordial. Tantos outros ramos sofreram durante a pandemia e o de alimentos foi o que manteve-se mais estável e rentável, já que é algo essencial para todos”, ela garante.

A população no campo tem envelhecido e a ida da família para o sítio é um ato positivo para a sucessão rural. De acordo com a secretária da Contag, Vânia Marques, faltam incentivos para a permanência da juventude no campo. “Um dos grandes gargalos para o meio rural tem sido a ausência da assistência técnica e, consequentemente, o fechamento de escolas no campo nos últimos anos, falta de planejamento de produção de agregação de valor, agroindustrialização e comercialização”, ela elenca.

 

 

 

A Hortaliças e Doces Caseiros do Vozão comercializa legumes, verduras, frutas e doces caseiros. Os doces são vendidos uma vez na semana na feira orgânica e os demais produtos são destinados às cestas compostas por itens da horta, que Juliana entrega às sextas-feiras no domicílio dos clientes. A divulgação é pelas redes sociais e por recomendação de quem compra.

Na propriedade também há um apiário para fabricação de mel; minhocas para produção de adubo e fertilizante orgânico, alinhado ao convívio com saguizinhos, macacos que vivem na floresta atrás da horta e gostam de visitar o local para se alimentarem de bananas e que tem convívio pacífico com os produtores.

A fabricação dos doces caseiros é feita com as frutas da horta da propriedade, aproveitando a sazonalidade da produção agrícola, o que se reflete na oferta. Quando a produção de beterrabas esteve em alta, aproveitou para fazer geleias e vender na feira. Para o próximo mês, já anunciou aos clientes que terá licor e geleia de jabuticaba.

“Algo que vendi muito foi meu último lote de goiabada cremosa. Colhemos goiaba até março e depois já não é mais época. Comprei um freezer, separamos a polpa da casca e congelei, o que me forneceu material para fazer doce até meados de agosto. Expliquei para os meus clientes para aproveitarem porque o estoque de goiaba acabou e agora só no ano que vem”, afirma Juliana.

Outros itens que compõem o doce, como açúcar e leite, também são orgânicos e provém da propriedade ou de pequenos produtores parceiros da região. 

 

 

“Eu faço pudim de leite, doce de leite cremoso e doce de leite pingado. O leite é do meu vizinho que mora no bairro e cria as vaquinhas soltas, com bezerro criado no pé, da forma mais natural e com menos conservantes e químicos possíveis”, ela afirma. “Como é um bairro rural, a gente nem sempre conhecia os vizinhos. Aos poucos fomos sabendo que alguém trabalha com queijo, outro tem batata doce no sítio, o que fomos aderindo ao nosso empreendimento e expandindo”.

Além da própria cesta, a Hortaliças e Doces Caseiros do Vozão fornece alimentos para outros “cesteiros” que também trabalham com o delivery de produtos oriundos da agricultura familiar, em outras regiões do estado, como a HomeHorta. Gerida por Raquel Daoud, a microempreendedora individual (MEI) resolveu investir no início da pandemia no projeto que tinha engavetado desde 2016. 

Raquel trabalha como personal trainner, mas sempre desejou empreender com delivery de frutas e verduras orgânicas do pequeno produtor para seguir seu propósito de tornar acessível a alimentação sustentável e nutritiva, além de diversificar sua fonte de renda. Em janeiro de 2020 buscou acelerar seu conhecimento com treinamentos no Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), para colocar em atividade sua microempresa.

 

 

“No dia em que a pandemia foi decretada eu fiz uma uma publicação no meu instagram pessoal e comecei a vender. Na primeira postagem eu vendi doze cestas. Fui ao pequeno produtor que conhecia, comprei os produtos e entreguei na segunda-feira. Na semana seguinte tive 28 pedidos e isso foi crescendo. Em julho contratei marketing, fiz uma página e comecei a profissionalizar”, relata Raquel. A captação de clientes, conta ela, é feita totalmente pelas redes sociais e por recomendações de quem já é consumidor.

Raquel organizou os processos para que pudesse tocar o negócio sozinha. Recebe os alimentos dos pequenos produtores em casa ou combina um ponto de entrega. Monta cada sacola, seleciona os produtos e faz cortes e ajustes, se forem necessários. Coloca as cestas no carro e às 13h começa a fazer as entregas no litoral paulista. 

“Eu comecei a atender o município de São José dos Campos nas quarta-feiras e nunca fiz restrição de bairro, entrego em lugares super longes. Quero atender a pessoa que queira participar desse propósito. Eu cobro uma taxa de entrega que varia entre R$ 5 a R$ 15. Depois eu expandi para o litoral norte. Eu altero entre quinta e sexta-feira, em um final de semana vou para o lado de São Sebastião até Maresias, outro final de semana vou para o lado de Caraguá até Ubatatuba”, ela conta.

 

Foi a disponibilidade de entrega da HomeHorta que permitiu a professora aposentada de São José dos Campos, Márcia Vanzella, de 58 anos, a continuar consumindo alimentos da agricultura familiar durante a pandemia, momento em que passou a comprar mais por delivery para respeitar as medidas de isolamento social. 

Márcia comprava os produtos agroecológicos de um trabalhador rural do assentamento da cidade, mas ele teve dificuldades em continuar a fazer as entregas devido ao avanço da pandemia. Foi quando Márcia conheceu a HomeHorta e tornou-se cliente, há mais de um ano.

“Sempre procurei fortalecer a agricultura familiar, pois entendo que é a maneira mais acessível para uma alimentação saudável. A HomeHorta surgiu como esta opção, principalmente, porque compra da agricultura familiar, com produção orgânica, livre de agrotóxicos e que inclui o pessoal do assentamento. Então, coerentemente com a nossa opção de fortalecer a agricultura familiar, de entender que esse é um caminho de democratização e de barateamento do acesso aos alimentos, a HomeHorta surgiu como uma luva”, ela afirma.

 

Márcia aderiu ao Clube da HomeHorta. A sua assinatura é trimestral e recebe os produtos a cada quinze dias. Além de acreditar que a ideia garante o recurso para a empresa, também fideliza e mantém a remuneração para os produtores rurais de uma forma mais efetiva nessa pandemia. 

“O mais legal é conhecer uma série de verduras e legumes que não conhecíamos e que não temos acesso nos hipermercados e, se tem, é de uma maneira elitizada. Então eu conheci a alface italiana, couve japonesa, batata doce meio branca, meio roxa, uma série de produtos que eu não teria acesso se não fosse através da HomeHorta”, Marcia elenca.

 

 

De um pequeno produtor na primeira semana, Raquel ampliou sua rede de parceiros e agora, na 71ª semana, faz um rodízio entre os agricultores familiares que fornecem alimentos para as cestas, buscando diversificar a oferta, já que especializam-se em um tipo de produção e ela deseja que todos sejam colaboradores da HomeHorta.

“Buscando por parceiros na região, acabei conhecendo a Raquel através de outro produtor e assim vamos construindo essa colaboração mútua. Sou grata por essa dinâmica que fortalece o meu e os demais pequenos empreendimentos e fortalece o local”, afirma a agricultora Juliana. 

“Acredito que a atividade da Raquel ajuda muito no aumento de renda de nós, produtores locais. Quando compram diretamente da gente estão valorizando nosso trabalho. Não há ‘intermediário’, não existem parcelas que vão para lojas e supermercados, nem serviços de transportes de longas distâncias. O dinheiro vem para o nosso bolso, e isso ajuda em questões financeiras e de rendimentos”, completa a trabalhadora rural.

 

Demetra
No litoral norte gaúcho, a Cooperativa Mista de Agricultores Familiares de Itati, Terra de Areia e Três Forquilhas (Coomafitt), resolveu investir no aplicativo Demetra para otimizar o trabalho no campo e acessar novos mercados. São 284 associados responsáveis, anualmente, pela produção de 6,4 mil toneladas de alimentos, entre 88 variedades.

O aplicativo oferece um caderno de campo digital para o agricultor planejar e organizar as atividades da propriedade, atendendo a Lei da Rastreabilidade, legislação que prevê a identificação de informações sobre a origem e rotas que o vegetal passou até chegar ao consumidor. É uma forma do cliente ter transparência sobre o produto que chega ao prato. Do lado do produtor, permite acessar mercados mais exigentes e otimizar processos no campo. 

“O aplicativo nos ajudou a abrir novos mercados porque conseguimos a rastreabilidade e emprestar as etiquetas para os produtos. Alguns clientes e supermercados já exigem isso e graças ao aplicativo temos a possibilidade de fornecer para os clientes”, diz o agricultor Lutierre Santos, de 32 anos, que faz uso do aplicativo. Durante a pandemia, a cooperativa de agricultores familiares abriu mercado para um hospital gaúcho, graças à ferramenta de rastreabilidade.

Cooperativa aderiu aplicativo para otimizar processos e abrir novos mercados. Foto por Allan Fernandes/ Comunicação Coomafitt

No aplicativo o produtor também tem previsão do clima georreferenciada, gestão da propriedade, interação com o técnico e pode integrar estações meteorológicas para melhores decisões de manejo. Lutierre vai para o segundo ano usando a ferramenta e conta que a adaptação foi tranquila devido a interface intuitiva. A internet não é um empecilho porque mesmo sem conexão no campo é possível colocar as informações no aplicativo e sincronizar os dados quando o aplicativo é aberto novamente com internet em casa.

O trabalhador rural diz que as funcionalidades do aplicativo o ajudam a planejar a safra do ano seguinte a partir das informações geradas pela organização do caderno de campo, estimativa de produção e gastos. “A assessoria pelo aplicativo é bem importante e durante a pandemia facilita o contato. Tu envia a dúvida ou uma foto da doença e o técnico te assessora pelo próprio aplicativo. Fica bem mais prático e fácil”, relata.

A presidente da Coomafitt, Michelli Jacoby, explica que 90% dos associados estão cadastrados no aplicativo e a entidade trabalha para ensinar os agricultores a usar a plataforma. “Os que têm maior dificuldade de adaptação são os que têm pouco estudo formal, são os que têm um pouco mais de trabalho para conhecer a ferrramenta”, conta.

O aplicativo foi desenvolvido pela startup gaúcha Elysios Agricultura Inteligente. Mário Brito, líder de desenvolvimento de parceiros da empresa, acredita que a pandemia acelerou o processo de digitalização dos agricultores, apesar dos desafios de conexão com o campo. 

“Hoje os smartphones estão mais acessíveis e o produtor vê o benefício de aderir às novas tecnologias. Por exemplo, com a pandemia muitos produtores aprenderam que podem utilizar o aplicativo da sua instituição financeira para tudo. E com o aplicativo Demetra o produtor pode ter a propriedade na palma da sua mão”, afirma.

 

Foto de capa por Allan Fernandes/ Comunicação Coomafitt


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