Bem-estar animal aumenta produtividade e ganho financeiro do produtor

Bovinos menos estressados e sem machucados geram carcaça de qualidade aos frigoríficos

25/10/2019 às 15:00 atualizado por Rafaela Flôr - SBA | Siga-nos no Google News
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A produção agropecuária tem acompanhado as evoluções tecnológicas desde a revolução industrial no século 18 e agregado às inovações no campo para aumentar a produtividade, diminuir os custos de produção e atender às demandas do mercado. O consumidor tem se preocupado com a origem do produto e a maneira que é produzido, principalmente os de origem animal. Por isso, o fenômeno da Pecuária 4.0 busca inovações tecnológicas em descobertas feitas a partir de pesquisas realizadas nas principais e reconhecidas instituições de pesquisa e desenvolvimento no Brasil. 

Segundo a definição do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), bem-estar animal está atrelado às condições em que o animal vive. Pensando nisso, e com estudos científicos para embasar a prática da criação de bois, a zootecnista Paula Martino fundou o projeto Carne com Ciência para desmitificar e quebrar barreiras sobre a produção do gado de corte e o consumo de carne bovina. 

A zootecnista explica que os principais indicativos de que o boi está confortável, saudável, bem nutrido e seguro é quando expressa seu comportamento inato e não manifesta que tem sofrido com estados desagradáveis, como por exemplo a dor, o medo e a angústia. Para Paula, a importância de o produtor se preocupar com o bem-estar de seus animais vai além do tratamento humanizado, pois interfere diretamente nos ganhos econômicos. “O produtor que abre mão da aplicação dos protocolos de bem-estar animal está colocando sua produtividade e retorno financeiro em risco”. 

Paula enfatiza que o animal que foi mal manejado sofre mais contusões e, consequentemente, suas carcaças têm menos qualidade, já que os machucados da carcaça são retirados no abate, isso prejudica o rendimento e o retorno financeiro ao criador, pois perde-se produto, além de maior incidência de carnes DFD (dark, firm, dry – em português: escura, dura e seca) causado pelo estresse. 

Manejo com boas práticas baseado nos métodos de bem-estar.
(Foto: Divulgação/Iepec)

Em relação ao manejo e as tecnologias que facilitam na implantação do método baseado no bem-estar, a zootecnista destaca a utilização de modernos troncos de contenção para a realização de manejo sanitário, além da estrutura no abate humanitário, que, segundo Paula, são essenciais para o sucesso do bem-estar animal e garantem carcaça de qualidade. “O frigorífico recebe animais de melhor qualidade, podendo produzir carcaças de maior valor agregado. E o consumidor final recebe produtos mais seguros, do ponto de vista de segurança alimentar, e com maior qualidade atrativa, pois animais que são bem manejados sofrem menos com o estresse no pré-abate e, consequentemente, diminui a incidência de carne DFD”.

A Fazenda Pecuária BR, considerada como vitrine tecnológica, adota o manejo racional e os métodos de bem-estar nos animais que chegam na propriedade. O médico veterinário responsável pela fazenda, Lourival Lucena afirma que as tecnologias são utilizadas para atingir as metas estabelecidas. “[Os protocolos de bem-estar são] conduzir os animais dentro de critérios de tranquilidade. Ou seja, os animais precisam adquirir confiança no homem, isso é o que nós temos como padrão. É isso que nós adotamos. O tratamento racional para que os animais não tenham o homem como inimigo e agressor”.

Curral antiestresse da Fazenda Pecuária BR. (Foto: Canal do Boi)

O médico veterinário explica que o manejo tradicional é aquele em que há gritos e geram situações de desconforto no animal, ao contrário do manejo racional com métodos de bem-estar, que procura construir confiança entre o cuidador e o bovino. “É muito bom quando a gente vê o animal que vai cheirar as mãos do funcionário, às vezes como se fosse agradecer os bons tratos. Isso estabelece uma condição muito melhor na relação produtiva e do homem com os animais”, enfatiza Lourival.

Lourival acredita no respeito e confiança entre animal e homem. (Foto: Gadiel Barros)

Tecnologia na produção

O bem-estar e a saúde animal são temas importantes e recorrentes ao falar sobre aumento de produtividade e qualidade no produto final que chegará ao consumidor. A pesquisadora da Embrapa Gado de Corte e doutora em Ciência Animal, Fabiana Villa Alves, buscando encontrar outros meios para avaliar o conforto de bovinos e garantir o bem-estar, desenvolveu um aparelho de monitoramento eletrônico que constata, por sensores, dados que informam se o animal está saudável. 

A pesquisadora explica que o bem-estar animal na produção faz parte de todo o contexto em que o animal vive e envolve a sanidade, nutrição, manejo, instalações e ambiência que garantem qualidade de vida. “A finalidade dela [Plataforma Eletrônica Bovina] é conseguir ter uma medida, direto no animal, se ele está respondendo de alguma forma ao meio ambiente em que está inserido”.

Fabiana enfatiza que, pela plataforma não ser invasiva, permite que o bovino de corte que tem pouca convivência com o ser humano passe por todo o processo de monitoramento sem que seja estressante, o que aumenta a qualidade da carne no produto final. “Sentimos a necessidade de ter avaliações que não tivessem interferência humana, porque se eu vou lá e coloco um termômetro, se eu fecho o animal no tronco para poder medir a temperatura, esse animal fica estressado pelo manejo. O coração bate mais forte, a temperatura aumenta”, explica.

De acordo com o 2º Censo da AgTech Garage, divulgado no ano passado, de 2012 a 2018 houve aumento de 16700% de startups criadas para atender o mercado agropecuário. Registra-se que existam cerca de 300 empresas voltadas para este mercado. Dos 184 empreendimentos que responderam a pesquisa, 30% atende a demanda do setor pecuário que busca aplicar as inovações e garantir melhora na produtividade. 

Elaborado por: Rafaela Flôr

A Indext, startup sul-mato-grossense, em parceria com a Embrapa Gado de Corte, participou do desenvolvimento do produto final após a conclusão do projeto de pesquisa que criou o protótipo do aparelho que monitora o conforto e bem-estar animal. O diretor da empresa e engenheiro de software, Ricardo Aguiar conta que a parceria iniciou como projeto de pesquisa para atender a demanda solicitada pela Embrapa à Faculdade de Computação da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (Facom-UFMS), no curso de Engenharia de Software, em conjunto com o programa de pós-graduação da faculdade. 

Aparelho é indicado para manejo sem estresse. (Foto: Divulgação/Indext)

O desenvolvedor explica que o produto final consiste em uma caixa que comporta sensores que monitoram a temperatura corporal e do ambiente, batimentos cardíacos e frequência respiratória do animal. Os dados obtidos são enviados para um cartão de memória. “Essa caixa fica presa no cabresto e encaixada na cabeça. Os sensores fisiológicos ficam na parte de baixo, em contato com a pele do animal. Os sensores ambientais ficam na parte de cima da caixa, em uma parte transparente para captar a luz e colher informações sobre a radiação solar e luminosidade. Na lateral tem um sensor que recebe informações da umidade do ar e temperatura do ambiente”. Ricardo ressalta que, para economizar a bateria do dispositivo, o aparelho liga e desliga automaticamente dentro de um período configurado no sistema do aparelho.

O dispositivo é posicionado na testa do bovino porque, de acordo com Ricardo, é o segundo melhor local para a captação dos dados fisiológicos necessários. “O oxímetro capta os dados do fluxo sanguíneo e tem locais no corpo que é mais fácil de detectá-los. Nos testes, durante a pesquisa, o melhor local seria a orelha, mas fica inviável para colocar o dispositivo. O segundo melhor lugar que encontraram é a testa do animal”, esclarece o diretor.

Texto supervisionado por Douglas Ferreira.


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