Monilíase acende alerta para produtores de cacau no Brasil

Transporte do fruto contaminado é a principal forma de disseminação da doença

28/08/2021 às 16:00 atualizado por Frederico Diegues* - SBA | Siga-nos no Google News
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Fruto atingido pela Monilíase 
Foto: Divulgação Mapa

Há pouco mais de um mês, foi detectado no município Cruzeiro do Sul, no interior do Acre, um foco da praga Moniliophthora roreri, popularmente conhecida como monilíase do cacaueiro. Na quinta-feira, dia 5 de agosto, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) publicou uma portaria que colocava o estado do Acre sob quarentena, com a finalidade de conter a doença antes de sua proliferação.

A praga, nativa do Equador, em condição de campo, pode afetar unicamente o fruto do cacaueiro. O alastramento é realizado principalmente pelo vento e as chuvas podem ter um papel secundário na disseminação da doença.

Em trajetos maiores, a praga se espalha através do transporte de frutos e veículos infectados, material vegetativo e embalagens contendo os esporos do fungo, que são viáveis por até nove meses em condições adversas.

Um dos principais meios de desenvolvimento são os frutos infectados nas árvores. As frutas mumificadas que permanecem nas árvores de uma estação para outra, tem papel importante como fonte de inóculo inicial da praga. A alta umidade relativa favorece o desenvolvimento do fungo que inicia em média uma semana após o surgimento dos sintomas, permanecendo intensa até dez semanas, quando a produção de inóculo cai para níveis insignificantes.

 

Um paralelo de impactos para o Brasil é a vassoura-de-bruxa, que na Bahia reduziu 75% da produção nacional (de 400 mil toneladas de amêndoas/ano para 85 mil toneladas de amêndoas/ano) e desempregou 200 mil trabalhadores rurais.

Os estados da Bahia e do Espírito Santo por terem favorabilidade ao estabelecimento de epidemias da monilíase, e ainda considerando o fluxo de pessoas desta região para países com a doença, estes estados estão sob alto risco da monilíase do cacaueiro.

No caso do Brasil, apesar de o Estado do Acre ter sido atingido pela doença, as condições geográficas, climáticas e a grande floresta que cerca a fronteira do país na região norte contribuem para que a praga, que vem sendo monitorada há mais de 15 anos, não se dissipe sozinha. 

Alex Terra, cacauicultor, diretor do Instituto Pensar Cacau (IPC) e proprietário da Fazenda Cravo Branco, em Santa Luzia (BA), afirma que os produtores sempre se mantiveram informados sobre as doenças que podem afetar suas culturas.

“A imprensa regional sempre publicou artigos e comentários sobre estes assuntos, ademais a CEPLAC mantinha nas rodoviárias um posto de fiscalização, era o ‘Cavab’”. comenta Terra.

O proprietário da Fazenda Cravo Branco, que possui área total de 100 hectares, com 20 hectares de cacau plantado e produção anual de 300 arrobas, explica que a Monilíase já era conhecida pelos produtores baianos. Muitos deles tiveram seu primeiro contato com o fungo após visitarem culturas afetadas no Equador.

“O Conselho Nacional dos produtores de Cacau também organizou uma viagem ao Equador, essa viagem foi amplamente divulgada e muitos cacauicultores foram. A monília não é desconhecida do cacauicultor baiano. Na câmara setorial do cacau era assunto corriqueiro, sendo que essas discussões da câmara eram rapidamente jogadas para os grupos de Whatsapp”, explica o produtor.

O produtor também expressou seu medo em relação à Monilíase do Cacaueiro, pelo fato das plantas existentes nas lavouras brasileiras não possuírem resistência nenhuma à praga.  

Segundo ele, é muito raro o desperdício de matéria prima na produção, o que poderia fazer com que a doença chegasse até a Bahia.

De acordo com Alex o IPC tem uma proposta elaborada para conter a contaminação: “homologar portos no Pará onde todo o cacau seria estocado, fiscalizado, controlado, certificado, feito tudo, e então embarcado em navios e levado para Ilhéus onde seria descarregado seguindo todo o protocolo, igual ao descarregamento do cacau africano. Isso evitaria muita coisa e facilitaria o trabalho da defesa agropecuária”, pontua Terra. 

Para impedir que a praga se alastre para todo o país, barreiras de fiscalização foram estabelecidas. A área de foco tem o acesso restrito a uma rodovia, além dos acessos fluviais da região serem isolados na bacia do Rio Juruá que não se comunica com as bacias que seguem para estados produtores do cacau, como a Bahia e o Pará. Neste caso, são necessários monitoramentos em áreas de várzea ao longo dos rios.

Por não existirem variedades das plantas que sejam resistentes à doença, as autoridades recomendam que sejam intensificadas as boas práticas agrícolas pelos produtores, além da vigilância permanente e imediata notificação às autoridades fitossanitárias, no caso de encontrarem frutos com sintomas suspeitos.

O fungo reduz o rendimento das lavouras de cacau em mais de 80% em poucos anos após o estabelecimento, tornando a produção economicamente inviável. Caso o foco da Monilíase não seja suprimido e a praga se introduza no Brasil, poderá ocorrer o mesmo que no estado de Tabasco, no México, que apesar de conseguir manter um nível de infestação da praga em 15%, os prejuízos chegaram à faixa de US$ 100 milhões, a cada ano, contabilizando-se apenas os impactos diretos ao produtor.

*com supervisão do jornalista Douglas Silvério. 


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